Notícias daqui

 

Meu relógio de parede está sem pilha, apoiado na báscula da cozinha há mais de um ano. Permaneço insone, prolixa, prosaica e agitada em horários peculiares. No meu colo, a cor do beijo do sol a contrapor-se aos cabelos iluminados. Dia desses, num impulso qualquer, cheguei a ensaiar tingi-los de volta ao castanho. Pinto as unhas de vermelho em looping. Marco máscaras, guardanapos, taças e golas alheias de batom bordô. E tenho a estranha mania de sobrepor a mão às velas até a prata dos anéis esquentar. Reconheço a embriaguez quando as pontas dos meus dedos dos pés começam a formigar. Minha mãe, pela primeira vez em quase vinte e três anos, me chamou de espevitada – adjetivo que nem mesmo na infância chegou perto de mim. Creio, convicta, que tenho sido inquieta, irreverente e descontraída como nunca antes. Talvez, me caia bem a qualidade “feliz”. Tenho sido menos introspectiva e mais falante – ainda que, ao final do dia – ritualisticamente, todos os dias – precise ficar em absoluto e prolongado silêncio; e a risada alta, que contrasta com o tom de voz quase engolido, tornou-se minha marca. Mando áudios longos para meus amigos rindo e, então, eles me riem de volta. Por sinal, meus amigos e minha família me salvaram de ser engolida pela nuvem pesada e pelo ar denso que me rondavam e, no lugar disso, me puseram envolta em beijos, longas chamadas de vídeo, alto mar, tapete de casa e Santa Teresa. Li de forma voraz para sobreviver. Escrevi setenta e cinco páginas, intercalando cafés quentes e banhos frios para permanecer acordada, enquanto minhas cachorras me afagavam.

Passei tardes inteiras com os pés na areia, as costas suadas e o frescor de alguma bebida, como há muitos anos não mais fazia. Minha boca se avermelha, as maçãs do rosto se rosam e, apesar de caiçara, reconheço sempre o cheiro de maresia. Gosto de cair o corpo, ainda quente, no sofá e torcer para despertar antes do sol ter ido embora. E gosto do contato da pele quente com o lençol gelado de ar-condicionado. Talvez eu seja tão tátil quanto olfativa. Faço diariamente, logo pela manhã, relatos detalhados dos meus sonhos à Victoria e sinto doer cada músculo da barriga de tanto rir. É como se toda a fantasia e a criatividade em mim acordassem enquanto descanso; como se meu inconsciente fosse um enorme emaranhado de ex-colegas de trabalho, florestas e festas, em roteiros apocalípticos ou epiléticos. Desejo e medo ecoando enquanto durmo. Aliás, nas últimas quatro sessões de terapia, fiz minha analista gargalhar por razões distintas e desejei profundamente que a vida fosse mesmo uma piada. E tenho entendido tanto de desejar que cogitei ligar para minha tatuadora para marcar de escrever frisson no fim da espinha. Recordei, então, a superstição de manter as tatuagens em número ímpar e pensei que seria bom que frisson estivesse acompanhado de frenesi.

Acordei em Arraial; no meu quarto branco em Copacabana; no alto de um hotel em Ipanema, de frente para o mar; no Catete; no tapete; e, em Botafogo, sequer dormi. Como verde todos os dias e brigadeiro com vinho aos domingos. Bebo uísque com três pedras de gelo e gosto de sentir o amargo descer o meu corpo, até chegar aos pés. Invento histórias para o homem bonito do prédio da frente. A casa nova tem suporte para rede e uma varanda que será coberta de plantas, com uma mesa de madeira na qual caberá uma família inteira. Simbolicamente, a vela que comprei no Caribe, antes de mudar para cá, chegou ao fim enquanto escrevo. E estou há uma semana conseguindo dormir do lado direito da cama. Minha mãe ainda perde o sono quando não estou bem, mesmo quando não digo nada, por pura sintonia. A notícia da gravidez de uma pessoa querida foi a melhor coisa do meu mês. Tenho cogitado voltar atrás e ter filhos. Três amigas perderam seus pais ontem. Eu oscilo entre o ululado encontro com a felicidade e um terror calcificado; entre um universo particular alcançado a duras penas – com poesia, música ambiente e até remédios – e uma realidade aterrorizante, com cobertura jornalística em tempo integral. E, perdida em olhos de jabuticaba, encontrei um novo e confortável lugar para a idealização e para querer, dia após dia, com lealdade ao meu desejo. E às crises de riso. Ao cheiro amadeirado do perfume na nuca e aos traços da boca decorados até mesmo com a tintura do vinho. Minhas roupas estão todas largas e descobri só agora que laranja me cai melhor que vermelho. A miopia chegou em quatro graus. Fiz as pazes com café da manhã. E escrevo, porque jamais pensei estar noutro lugar que não nas palavras.


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Jogo


Ler ao som de "Video games", de Lana Del Rey.

 Meu corpo rejeita qualquer contato físico enquanto discuto convicta de estar certa. Você estica o braço para tocar a minha perna e eu recuo, ocupando o mínimo espaço que posso. Era uma distância física, emocional e espiritual. Eu me sentia pequena, porque, naquele momento, você me diminuía. Lembrei-me do dia na praia em que me pediu para não mostrar tanto e pareceu surpreso e decepcionado por não te acatar. Mas você gosta que outras pessoas mostrem. E as vê.

  Desculpe-me, querido, mas eu preciso desabrochar. Não é como se você não fosse o que mais quero e parte de tudo o que planejo para amanhã e daqui a cinco anos, mas você também me faz pensar que não sou suficiente. E, até mesmo na minha maior solidão, fui suficiente para mim mesma.

 Você está despedaçando aos poucos e às vezes volta para tocar na mesma ferida. Não me sinto má por ser quem arranca tudo de uma vez, não cultivemos sofrimento. Quando desligamos o telefone, o silêncio me preencheu como há um tempo não acontecia. Rompi muitos silêncios para não te abandonar no desespero de não ser ouvido. Talvez não tenha notado, mas é exatamente porque nunca quis fazer parecer um sacrifício o que, na verdade, é amor.

 Observei você até te apreciar de verdade. E agora não há uma vez em que não te veja com o olhar devotado de quem tem tudo o que quer. Quando pensar que estou afastada, lembre-se que continuo no meio do caminho. E, mesmo sendo ele distante dos nossos lugares iniciais, é o mínimo para alcançarmos um ao outro.

  Também sinto saudade quando olho para trás e vejo minha versão original e pura, mas, por outro lado, sou tomada por empolgação quando olho para frente e consigo te enxergar. E isso justifica qualquer pendência com o meu eu primevo.

  Pensei estar muito fora de mim, porque era isso que me fazia acreditar, mas, enfim, senti a legitimidade das minhas razões. Quando você me subestimou, deu-me uma força sobre-humana para exercer minhas vontades e fazer valer o que sinto. Então, se isso for uma competição, não duvide que jamais estive tão disposta a ganhar. E, suas expressões, que só me fazem sentir a mais simples felicidade, desta vez, não têm força sobre mim. Recoloquei a armadura. 


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Por que não consigo levar o blog (e outras coisas) a frente



  Perdi as contas de quantas vezes escrevi uma postagem sobre como minha vida tem sido corrida e atribuí isso ao meu sumiço de algum lugar (rede social ou vida de alguém). Esses dias me confessei baixinho que o motivo real, na maioria das vezes, foi medo. Toda vez que entro para um novo grupo, me policio para que ninguém nunca encontre o blog, porque ele tem tanto de mim, que me sinto completamente exposta. Nem penso no quanto já gostei de escrever aqui e no quanto foi bom, em diversas situações, colocar para fora todas as coisas que me sufocavam. Talvez eu deva ser mais grata ao blog do que a essas pessoas. As pessoas que são novas na minha vida (e isso varia de fase em fase) acabaram de chegar e esse espaço, que parece até infantil aos olhos alheios, me proporcionou conhecer pessoas incríveis e estar em paz comigo mesma. Nunca fui do tipo de pessoa que quer de qualquer maneira agradar e conquistar os outros. Sempre tentei ser muito autêntica e honesta em relação a quem sou. Mas o blog é sempre algo que faço questão de esconder.

 Acabei de entrar na faculdade e, obviamente, vou deixar de postar os links dos meus textos no Facebook, porque tenho medo de me expor e dos julgamentos sobre isso ser muito bobo ou sem sentido, porque o "público" é pequeno. Se a minha universidade me faz sentir livre em vários aspectos, ela me sufoca quase todos os dias por ter tanta gente que, de alguma maneira, parece ou se faz parecer melhor. Às vezes, só quero gritar.

 Outra coisa que me afastou daqui foi meu antigo relacionamento, que chegou a um ponto que escrever me fazia mais mal do que bem. Afinal, não queria manter meu sentimento por uma pessoa que só me traía e aprisionava e sabia que qualquer texto postado, seria lido por ele e só alimentaria meu ciclo de reaproximação e decepção. Demorei. Mas agora estou livre.

 Desde criança, sou muito ansiosa e em 2014 passei a frequentar o consultório de uma psicóloga para amenizar esse problema, e porque realmente prefiro falar sobre minha vida pessoal com alguém que se isente de julgamentos. Um dos fatores que potencializavam essas crises de ansiedade que andava tendo ("crises" porque tinham efeito físico, inclusive) era o tal relacionamento que já mencionei. Interrompi as idas à terapia, porque, além de ter melhorado, o ano do vestibular não me deixou tempo. Agora que mudei de cidade, quero procurar outra psicóloga, porque tenho tido outros episódios de ansiedade, mais leves, mas não quero que tomem proporções maiores e físicas novamente.

 Então, é basicamente isso: me ausento daqui por medo e vergonha, correria da vida e ansiedade. E talvez seja por esses motivos que mais precise escrever.

 Acho que é a primeira vez que desabafo assim, tão diretamente, e, se não desistir e apagar depois, saibam que nunca fiz nada para aparecer. Nem abrir minha própria vida. Essa é a forma que encontrei de estar mais sã. (A música ali em cima diz bastante sobre como me sinto).

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Rompendo


























Leia ao som de "Rise Up", da Andra Day. 

 Eu ouvi a mesma música três vezes para ver se a melodia melancólica me fazia colocar para fora o que sinto, mas no início da quarta, percebi que era uma grande besteira querer externar um sentimento que sequer entendo. Talvez deva admitir que as coisas não estão sob o meu controle e que de agora em diante tudo deve ser sentido gradativamente, conforme acontecer. Vasculhei meu próprio perfil e revi nossas fotos, e pensei no quanto parecíamos uma coisa só há bem pouco tempo. Não sei ao certo se nos desgastamos ou se era apenas uma fase de quem está crescendo e fazendo escolhas, mas os últimos meses foram um pouco frios. E eu lamento não ter percebido que estávamos nos despedindo, e não amadurecendo para dar um passo adiante. Creio que tenhamos perdido tempo ao medirmos ego para ver quem pediria desculpa primeiro. Este é o momento: devemos ser realistas,  baixar a guarda e pedir perdão por termos desperdiçado um tempo que, possivelmente, não teremos adiante.

 Apesar da culpa pelo que não foi dito, mas deveria ter sido, o que realmente nos abala é a nostalgia por tudo o que dissemos e vivemos. Porque se nossos bons e maus momentos fizessem uma queda de braço, não preciso dizer que nosso fricassé e brigadeiro venceriam. É difícil substituir seu rosto pelo de alguém imaginário, que vai tomar seu lugar na cadeira da cozinha enquanto preparo algo. Não consigo sequer cogitar que serei tão desinibida nos ensaios fotográficos que invento, se outra pessoa estiver atrás da câmera. Acho que nunca nos questionamos como seria se não desse certo.

 Fico pensando quanto tempo tudo levará para se estabilizar. Em quanto tempo teremos a sensação de que esse sentimento confuso, de dúvida e mudança, sumirá? Temo sentir a dor da ruptura durante muitos meses ou anos, não sei. Ou de um de nós mandar parabéns só nos últimos minutos do aniversário do outro, porque sei que causaria uma grande chateação. Cinco anos são um bom tempo para as coisas ficarem intactas. Ainda mais quando se trata de pessoas tão camaleônicas como nós.

 Eu, sinceramente, não sei se recusou meu convite para o cinema na sexta-feira por ter mesmo um compromisso ou porque estamos adiando encarar os fatos. Uma hora teremos de nos olhar e dizer aquelas palavras acerca de partidas, lástimas e apreço. Espero que até lá algo mude milagrosamente a ponto de substituirmo-nas por frases exclamativas de comemoração e espanto por sermos agraciados por Deus com a bênção da eternidade (ou algo parecido, ou que ao menos nos faça acreditar que isso existe). Mas, caso realmente tenhamos de lidar com a dureza da vida adulta, vamos fingir que todos os dias foram como as nossas viagens e que tudo o que sentimos foi o que registramos nas fotos.

Imagem: We Heart It

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É verão


Ler ao som de "I'm with you", da Avril Lavigne.

 Depois de as flores renascerem, vem, enfim, o verão. Nunca foi minha estação favorita, mas tudo fica a flor da pele, assim como a gotas de suor. É quando, finalmente, os compromissos são menos ferrenhos e estão espaçados por semanas preguiçosas. E podemos nos ver. É quando o ano nasce, ainda sem a carga de obrigações, que posso concretizar com você a minha preguiça no meio da tarde. Nós tiramos e botamos nossas camisas com mais frequência e deitamos na rede da casa de nossas avós para conversar sobre banalidades. Temos tempo para cafunés e artigos sobre a economia do país, fazendo pequenos intervalos que variam de cinco minutos a duas horas para nos beijarmos.

 Não gosto tanto de praia, mas adoro ver você tirar a camisa para entrar no mar, e fantasio metade de uma strip-tease e chego a esquecer todas as outras pessoas que aglomeram nosso espaço na areia. Sei que também não pensa boas coisas a meu respeito enquanto espalha o protetor na minha nuca. Mas fico feliz quando as folhas do calendário passam até a fase em que as flores caem e, já de longe, você me deseja uma boa noite. Nosso desejo é preenchido de bem querer.

 E quando, no meio do verão, o termômetro marca 27° e o calor nos concede sua graciosa trégua, usamos isso como pretexto para eu não ir embora para casa e fico contando quantos brinquedos do Mc Donald’s há na sua estante e acho uns presentes bonitinhos de ex namoradas e, então, conversamos sobre Mario Kart e traição, e ainda edito suas fotos. O que nos mantém, além de um enorme prazer em despir um ao outro, é toda essa reciprocidade e fidelidade de entender as coisas com o olhar (e dizer outras com a boca, para que o outro não se sinta ao léu). Gosto do cheiro de madeira dos móveis planejados para a sua versão de 14 anos,e gosto também das comidas do café da manhã da sua casa. Mas eu realmente adoro a maneira como sua mãe acredita que venho só para jogar video-game e me trata como uma filha.


 Sinto-me incrivelmente livre de poder sair para um barzinho com as minhas amigas ao sabádo e saber que você não fez muito diferente disso. Você não coloca nosso respeito como preço pela minha liberdade. É verão e podemos sair de mãos dadas ou não. Ficar juntos ou não. Sair com todos os nossos amigos separadamente. E estaremos aqui um pelo outro com muita verdade, porque é isso que somos e temos a oferecer. É natural a ponto de não sentirmos a necessidade de nomear isso, é apenas a tranquilidade de deitar no peito de alguém de quem é bom estar junto. É verão e eu gosto da sua pele morena, dos seus livros de cara mais velho, das suas explicações sobre Relações Internacionais e do seu beijo. 

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Hey, garoto

 Leia ouvindo "Farsa", da Manu Gavassi.

Hey, garoto, talvez seja a hora de esclarecermos o que ficou pendente do nosso ano desperdiçado. Poderíamos falar sobre como nos conhecemos e meu arrependimento por não ter trocado aquela noite por Netflix, mas hoje é você quem senta aí para me escutar. Os seus pedidos de desculpa e beijos não são bons argumentos quando, agora, tem alguém que pode descobri-los.

 Não vamos falar sobre suas ligações há menos de dois meses com saudade do meu perfume no seu carro e suas premissas pouco criativas para vir me buscar, nem de todas as fotos curtidas para sinalizar “preciso de você aqui”, muito menos do “eu não tenho nada com ela”. Hey, relaxa. Isso é um segredo nosso. Se ela puder te levar para bem longe, ela é mais um presente para mim que para você.

 Esqueçamos suas crises de ciúme e seus interrogatórios sob a prerrogativa de preocupação, das mensagens justificadas por excesso de álcool e dos telefonemas com o pretexto de reatar a amizade que jamais antes existiu. Você é um grande borrão na minha memória, é como ter estado todo este tempo bêbada: eu me diverti bastante, mas, depois, a cabeça doeu. E agora eu não lembro de nada.

 Prometo não contar para ninguém sobre as quatro vezes que te deixei para tentar descobrir o resto da vida e você correu para segurar o meu pé (e, logo em seguida, beijá-lo). Nós temos esse pacto de silêncio e eu faço questão de nunca quebrá-lo, porque eu quero cair no seu esquecimento absoluto, assim como já fiz.

 Garoto, você é a minha amnésia favorita, porque nunca antes gostei tanto de esquecer algo. E quando me dizem que esbarraram com você na praia ou na rua, eu expresso tanto sentimento quanto se me dissessem que uma mariposa posou num cágado (ou ainda menos). Espero, sinceramente, que um dia lide com isso como alguém da sua idade e não como uma garotinha mimada que quer algo que os pais não podem comprar. Hey, tô fora. 

  Imagem: clipe de "Camiseta", da Manu Gavassi. 

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#PraResumir: final de 2015


Oi pessú! Há muito tempo não faço m post aqui que não seja texto ou vídeo. Resolvi, então, resumir o que aconteceu durante novembro e dezembro. Um dos motivos para eu ter sumido de todos os lugares, foi a minha decisão de me dedicar plenamente a estudar. E, a foto acima, representa minha enorme gratidão a tudo que aprendi.


 Essa é a Mel, minha cachorra, invejando meu churros quase completamente devorado. 


 Decidi que toda vez que terminar um relacionamento, vou fazer um ensaio fotográfico. E às vezes calha da gente gostar mais do ensaio que da pessoa com quem terminamos. 

 
 A primeira festinha do ano foi no final de novembro (é só para vocês terem noção do quanto saí em 2015).


Terminei o Ensino Médio e teve viagem de formatura!


 Foi um mini cruzeiro e, obviamente, a melhor viagem de 2015.


Dias de não muito glamour em Vila Velha.



 A sós com John Mayer e vinho em Vila Velha (agora, um pouco mais de glamour).


O novo EP da Manu Gavassi me relembrou por que sou tão fã dela. 


Natal, amor e meus avós.


 Parque de diversões com amigos e maturidade.


Um plus da formatura (na minha cidade!) e evidências de que ando faltando a nutricionista e a dermatologista.


 Crise existencial.


 Sendo a prima mais velha.


 Pessú, as fotos não estão sob um padrão e sei que isso dá nervoso, mas é como elas estavam no meu celular. Meus últimos dois meses podem se resumir a isso e uma bomba de emoções que, talvez, eu fale depois.

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Sabonete


Leia ao som de 93 Million Miles, do Jason Mraz. 

  Há quase dois anos, me despi, entrei no box e abri o chuveiro. Quando olhei para o sabonete, numa saboneteira  branca, bastante manchada, e meio sem graça, odiei ter que tomar banho com ele. Já faz tempo e eu não lembro mais qual era, mas me recordo de ter ficado decepcionada, porque, para mim, ele era péssimo. Passei-o na pele e, como de costume, fechei os olhos e comecei a pensar sobre uma série de aleatoriedades e um imenso sentimento de culpa me invadiu. Eu estava com raiva por ter de tomar banho com um sabonete que, ao meu ver, era horrível. Comecei a pensar nos meus pais e na nossa vida, cheia de altos e baixos, dos quais, na maioria das vezes, eu era poupada e protegida. Parei – completamente- , olhei para a minha mão e para aquele simples sabonete, e pensei na difícil tarefa que deve ser manter uma casa e sobreviver ao caos da vida com dignidade. Analisei, durante uns poucos segundos, as prioridades que alguém tem ao manter um lar: as contas e a comida. E, só assim, me dei conta do quão supérflua e indiferente é a marca de um sabonete no meio de tantas coisas realmente grandes, que passam despercebidas para quem apenas usufrui de tudo isto.

 Os últimos dias foram confusos, tanto no convívio com as pessoas quanto dentro de mim, e enquanto almoçava lembrei do dia do sabonete e de todos os pensamentos mesquinhos que andava tendo (e de outros que estavam tendo sobre mim). E pensei que não há uma escala precisa e universal de importância: as coisas têm proporções distintas para cada um. O meu grande talvez é uma banalidade para quase todos que me cercam e as minhas palavras rebeldes são uma bala precisamente mirada no coração de quem as ouviu. Os efeitos nem sempre são os mesmos e, muito menos, os desejados por quem os provocou. A percepção do que nos cerca e do que causamos é a parte mais difícil, porque, às vezes, ela pode nos mostrar o quão distantes de quem gostaríamos de ser estamos. E dói.

 Inícios inspiram calmaria e esperança, mas o clamor por mudança e evolução pode se mostrar de forma nada branda: as mudanças drásticas normalmente vêm precedidas disso. Então, acolher o novo é basicamente assim: dá-lo a chance de ser mestre e, em silêncio, ser a melhor versão deste alguém que há anos está sendo construído. Eu sou composta de diversos minúsculos infinitos, grandezas e simplicidades, que, para quem não está na minha pele, são apenas pequenas coisas invisíveis, tal como o sabonete que não era o esperado, mas tinha sido a melhor escolha de quem o comprou.

 Só quem executou toda a construção de quem somos sabe o grau de importância e peculiaridade de cada pedaço: nós mesmos. E, por mais que doa, nem sempre as pessoas compartilharem da grandeza que alguns detalhes têm para nós, é bom saber que dentro de nós há, intimamente, coisas muito preciosas. O segredo para nos sentirmos compreendidos com toda a multiplicidade que carregamos é apenas um: tentar fazer o mesmo pelo outro.

  

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Ninguém






































                                        Leia ouvindo "Nobody", da Selena Gomez. 

 Eu me sinto um pouco sufocada por todas estas perguntas e pelo medo do que está por vir. Mas, ontem a noite, você esteve aqui e instantaneamente as coisas se acalmaram. Você sempre me mostra o caminho e segura minhas mãos para que siga segura por ele. E, em meio a toda a minha insegurança e aos meus muitos complexos, você acaricia meus cabelos e diz: "você é quem sonha e não o que dizem". Queria que todas as pessoas pudessem sentar a sua frente e te ouvir falar. Porque ninguém jamais me amará como me ama.

 Quando já é tarde e todos foram dormir, eu deixo os sentimentos escaparem e, involuntariamente, me sinto sozinha e perdida. Mas você lê os meus pensamentos e ouve minhas perguntas a mim mesma, feitas em voz alta e cheias de dúvida, e me pede para esperar pelo melhor. Eu gosto de ser ninada por você e logo caio no sono, com a leveza de uma criança e a segurança de quem é amada e protegida. Ninguém me entende como você.

 E quando escapo dos assuntos boêmios de algum barzinho e vou ao banheiro, olhar no espelho e tentar enxergar quem realmente sou, você vai até lá para me lembrar do que conversamos antes de dormir. Você me lembra de que o meu lado bom sempre vence o confuso. Volto para fora com a certeza de que um dia vou despir as camadas que me cobrem e sufocam, para ser somente a garota que você conhece. Afinal, ninguém me conhece tanto quanto você.

 Às vezes, me pergunto por que, onde e quando. "Por que ainda não?", eu digo antes mesmo de abrir os olhos. A culpa me consome. E você me abraça, em silêncio, atestando que a paz deve ser o remédio para a espera. Eu viro os relógios para a parede e aboli os calendários desta casa, só para não ser corroída pela expectativa. Mas parece que você apressa os ponteiros e me distrai com o resto da vida. Ninguém consegue driblar tanto o tempo.

 E, hoje mesmo, eu pedi ajuda para ir embora, te implorei para fugir. Você me negou o pedido. Disse-me que a pessoa que luto todos os dias para ser, sai pela porta da frente com saudações de despedida e um "volte sempre" e que será assim comigo em breve. Eu aguardo esse "em breve" com todo o meu coração, com muita convicção de que, sim, eu vou e iremos juntos. Porque ninguém está tão presente em mim quanto você. Eu me nego a acreditar que exista alguém como você, porque, realmente, não há.

Imagem: We Heart It

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Sozinha


Leia ouvindo esta música!

 Olhei para a cama gigante, nunca esteve tão convidativa. Duas taças de um vinho português e o quarto parecia absurdamente quente. E vinho sempre causa duas coisas: coragem e sono. Eu tirei a calça e me atirei. Estava, enfim, sozinha. Sozinha com essa cidade cheia de luzes e cheiro de maresia. Deitei e vi no teto um retroprojetor da minha mente confusa. Não adiei nada: revirei cada acontecimento, cada “tchau”, todos os “nãos”, as bocas, os meses e as indecisões. Eu estava em um lugar em que as pessoas sequer sabiam meu nome, porém, apenas de uma coisa não podia fugir: de mim mesma. Era a hora de me despir. Água gelada e cabelos molhados – e, também, sentimentos expostos. Todos refletidos no espelho. Os quilos a mais não negam que troquei a aparência pelos meus sonhos.

 Voltei para o quarto e sussurrei: “enfim a sós” e dei uma piscadela para a minha própria imagem no guarda-roupa. Conheci uma nova série e fiquei dividida entre o mocinho e o vilão. Fui ao cinema e usei três cadeiras para deitar. Gargalhei alto e troquei sorrisos com um funcionário na saída. Comi todas as porcarias que amo e perdi dois quilos caminhando todos os dias na orla durante o por do sol. E pensei em entrar no mar a noite.

 Confrontei-me sobre os próximos meses, mas me distraí comprando livros novos. E esbarrei três dias com um cara que, no final, acabou deixando seu perfume no meu vestido. Ri, sozinha, do quanto minha vida parece um filme adolescente. Desejei ficar pela primeira vez e até fiz uns planos de conhecer os bares na rua da faculdade. Ou ficar assistindo filme e dividir a pizza com uma nova pessoa. E ela me pediu para ficar mais um pouco ou, quem sabe, voltar de vez.

 Não respondi nada. Não posso falar sobre pessoas e futuro agora que, finalmente, tenho conseguido ser alguém real. Mas também não desejo ser como as que me fizeram demorar a me tornar isso. Sozinha, eu tenho ido longe, porque ninguém me pede para esperar um pouco. Não tenho precisado carregar nada nas costas e tenho andado rápido graças a isso. Sozinha, com todos os tempos verbais e existenciais, descobri que é um grande presente vivê-lo.

 Volto para casa em breve, minha mala é bem pequena para os meus padrões e, o que não cabe nela e no peito, eu abandonarei aqui. E, por incrível que pareça: não há quase nada sendo deixado para trás, porque a bagagem jamais esteve preenchida por tantas coisas boas e concretas. 


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Cidades grandes e nós dois


 Estou em mais uma cidade grande, tirando férias da minha pacata vida de garota do interior – e sei que faria uma observação: sou uma garota do interior apenas por morar nele, porque na prática sou uma garota-mundo. Você me deixa constrangida com essas expressões enigmáticas meio elogiosas. Eu costumo ser mais objetiva e falo logo da sua barba e da sua, aparentemente, inesgotável paciência. Mas, voltando a metrópoles e prédios: sempre que os vejo, lembro daquelas coisas que me diz a cada fevereiro sobre morar em um deles somente até ter dinheiro para comprar uma casa e ter uns dois ou três filhos e a menina, ah, a menina vai se chamar Sophia, e você tem pavor de um dia ela chegar em casa dizendo que arrumou um namoradinho. Ouço isso desde os quinze anos, quando ainda tinha coragem de usar um lacinho de pérolas no cabelo; e agora já estou aqui: crescida e ligando aos prantos para uma amiga, para dizer que é difícil passar tanto tempo sozinha longe. E, toda vez que é você quem está do outro lado da linha, me diz “calma, meu bem. Tudo vai se acertar”. Odeio que acredite tanto assim no destino. Principalmente no nosso.

 Não que eu descarte definitivamente ser dona de uma dessas janelinhas acesas lá no alto junto a você. Só não quero parecer menos dona dessa decisão por nos deixar tão nas mãos do futuro. Você nunca foi o meu “com certeza”, mas seria uma bela cereja do bolo em que botei a mão na massa para fazer. E cá estou: sentada em frente ao forno, esperando-o ficar pronto, enquanto você ainda acha cedo demais para saber se pode ou não estar em Paraty no próximo carnaval.

 Por todas estas coisas e algumas outras, invejo seu trabalho. Você investe o seu tempo em cuidar de pilhas de papel e deixa as pessoas sob a responsabilidade do destino. Temo por você. Temo pensar que vai amar alguém e irá pedi-la que aguarde um pouco mais até poder comprar uma casa com jardim (e eu sei que irá comprar); e que, depois, dedique-se completamente ao mestrado e, ainda mais a frente, peça-a para esperar você juntar dinheiro para a viagem de aniversário de casamento e que, um dia, chegue em casa e a veja pela última vez, porque esperar cansa e o tempo não brinca de estátua. Eu também não. E é por isso que gosto de cidades grandes: elas nunca me permitem ficar entediada. Elas não admitem inércia sentimental: sempre há algo a ser sentido, seja bom ou ruim. E você não me faz sentir nada novo desde o dia em que te conheci. 

Imagem: We Heart It

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120 dias pensando em você


 Veja que boba sou, estou aqui escrevendo sobre e para você. Agora fora do meu moleskine vermelho. Meio na lua, que hoje está em eclipse, meio aí na sua casa (em pensamento). Sei que, caso estivesse aqui, riria com tamanho desconcerto e com o corar das minhas bochechas, como em todas as vezes que penso em você. Quando cruzou aquela porta, te achei estranhamente bonito, mas também pensei que sua camisa e sua bermuda não combinavam muito. Eu quis saber seu nome, mas não tanto quanto o de um outro garoto que chegou antes. Você falava de um jeito engraçado e, ao mesmo tempo, irritante, então eu preferi te achar apenas irritante. Mas de vez em quando meu escudo falhava, e eu soltava uma risada discreta por uma de suas piadas (droga!). Implicava mentalmente com tudo o que dizia e até com o que eu achava que você estava pensando. Você parecia não achar nada de mim. Até eu me meter em confusão e passar a ser uma semi-heroína fruto da sua ingênua imaginação.

 Eu parei de falar de você e passei a falar sobre você. E a te achar inteligente. E engraçado. Você não é bobo como imaginava, confesso. Na verdade, é bastante engraçado. Adoro o quanto é justo. Quando vê algo errado, fica sério e ainda mais bonito. Pode até ser que seja só um adolescente impulsivo, mas até seus impulsos revelam o coração bom que tem. Às vezes, eu paro e fico te admirando. De soslaio. Não dou o braço a torcer.

 Se pudesse, voltaria àquela festa e te responderia diferente. E dançaria com você. Talvez até te roubaria um beijo, mas todas aquelas pessoas nos olhariam e eu prefiro quando estamos só nós dois. Voltaria aos cinco minutos em que falava sobre meu medo do futuro despretensiosamente e você parecia não duvidar nem um pouco de que tudo daria certo. Também gosto desse seu lado.

 Azul turquesa é minha cor favorita desde que saí da fase Barbie e “patricinhas influentes da escola”.  Azul turquesa é a cor dos seus olhos assustadoramente hipnotizantes (às vezes eu desvio o olhar de agonia do quanto eles são bonitos, você percebe?). E, ainda mais, você é fã de Lulu Santos e cantarola Skank por aí. Odeio ter descoberto essas coisas. Elas me fazem pensar em você e no quanto ficaria lindo usando preto. Aliás, você não tem nenhuma camisa preta, não é? Pensando no fato de eu não estar aqui antes, ainda bem que não tem.

 Mesmo que seja só uma grande brincadeira ou gozação da vida, algo me diz que, caso não seja agora, vamos nos esbarrar por aí, tomar uma taça de vinho e lembrar que não sou atraente comendo McDonald’s e que você dormia escorado em qualquer lugar. Mas espero te reencontrar amanhã e não daqui a três anos. Desde que notei quem realmente é, não quero esperar mais que um dia até te ver novamente. 

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Considerações finais



Leia ao som dessa música! (Dessa vez, vocês só saberão abrindo, hahahaha)

Já nos despedimos tantas vezes que esta, provavelmente, parecerá mais uma. Não posso lhe afirmar que esta sim será "para valer", porque todas as outras também foram, como bem sabemos. Em todas as vezes não queria olhar para trás e apenas ir em paz. Mas algum mistério do universo-você-cosmo-química-astrologia me trazia de volta. Uma coisa que, ao chegar, parecia ser um grande alívio e, ao longo do tempo, se tornava um grande nó no pescoço novamente. Uma coisa que me proporcionava a incrível e extasiante experiência da reconciliação e a maldição do fracasso e da decepção. É por isso que estou sempre indo: você jamais está ficando. Quando muito, você está.

Toda vez que me despeço, tenho a intenção de que seja a última. Seu cheiro de Malbec com Marlboro já está entranhado nas minhas roupas, no meu cabelo e até na minha pele. Eu tenho o seu cheiro e não posso agarrá-lo. Uma parte de você está sempre em mim, apesar de que, quando o imagino, quero concreto. Eu sei da falta que faço. Eu sei que já beijou outras garotas e, ao fechar os olhos, me imaginou. Sei que sou, todos os dias, o pivô da briga entre você e sua covardia. Acho que o conheço tanto, a ponto de saber o que tenta esconder de si mesmo. Quem disse que viver isso nos faria mal? É você quem faz se tornar uma dinamite toda vez que torna nosso amor um jogo de vai e vem.


 Eu gostaria muito de ficar. Gostaria ainda mais de ir. Gostaria de poder fazer algo definitivo. Por favor. Pare de fazer nosso amor de refém. Você é um homem agindo como um garoto que se perde da mãe numa multidão. E eu sou uma menina tentando assumir o papel de Mulher Maravilha. Andamos sempre na contra-mão. Um do outro. Porque se ao menos andássemos juntos nela, chegaríamos a algum lugar.


 Queria poder te abraçar, olhar nos olhos e acariciar seu rosto para mostrar que não levo nada de ruim, talvez nem haja o que levar, no geral. Eu não te amo mais, mas eu ainda gosto de quando é sua melhor versão comigo. Sei que, mesmo distante, há uma parte de mim com você e não quero cobrá-la. Eu vou sim. Já quebrei tantas vezes, que esse pedaço não me fará falta. Mas, talvez, para você, ele faça. Ele tapa esse buraco que ficou da vida e das pessoas antes de mim. É seu, pode ficar. Seguirei bem sem ele e, melhor, sabendo que não te deixo ao léu.


 Guarde-me como algo bonito e faça ser assim com quem chegar daqui para frente. Não estou indo para te machucar ou por vingança. Estou indo para me salvar. Sei que já há alguém esperando por mim lá, que esse alguém, diferente de você, vai me pedir e me fazer ficar. E eu vou ficar. Já estava escrito. Mas, pense bem: você não estava. Eu mesma fiz isso. Você foi uma história escrita com a minha caligrafia e sem roteiro específico. Acho que só sou boa com introdução e desenvolvimento.


Imagem: We Heart It

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Aqui































 Marquei, bem aqui, às sete. Esperei-lhe ansiosa e usando o meu melhor perfume. Os ponteiros andaram diversas vezes e meu pé doeu; sentei. Contei estrelas, contei histórias, contei minutos. E, mentalmente, justifiquei o atraso, tentando me auto-enganar. Você não veio. Perguntei ao moço do carrinho de pipoca no dia seguinte; você não veio. O contratempo foi descobrir que você não queria vir.

 Hoje estamos, à luz do luar, no mesmo lugar, com todas essas bandeiras sobre nossas cabeças e esses paralelepípedos sob nossos pés. Você não está aqui porque sabia que eu também estaria, porque nem eu sabia. Você está aqui porque quis vir. Porque quis encontrar algo que permitiu que caísse caminho afora. Eu estou aqui, porque gosto desse lugar. Os cacos das nossas memórias não me são úteis, mas o que ficou de bom, como já disse, ficou. Até as dores são boas lembranças por terem me tornado quem sou.

À noite, fechei os olhos e senti que algo bom estava por vir. Faz tempo, mas logo fui boicotada pela vida, que me fez tropeçar em nós e cair. Andei por aí, desbravei corações, mares, noites, bocas, músicas que não eram a nossa. Tornei-me mais segura, continuei sendo a menina que senta no meio fio para ouvir histórias dos rapazes que conheço, mas conheci a mim, tomei um bom vinho, tirei o excesso de cabelo, de traumas, de apego e mágoas. Ainda sou a moça que delira quando vê prédios muito altos, mas agora também sou quem vai morar em um deles.

 Você está aqui. Nada é o mesmo. Você não está intacto, nem quem somos e o que fizemos de nós. Quase tudo mudou ou esteve em outro lugar, mas a igreja é a mesma. O moço da pipoca também. E a essência do que sentimos ao fechar os olhos todas as noites. Dessa vez, você não quer tudo. Você quer me amar. Assim: simples como deve ser. Sem o passado assombrando, mas com todas as provas mais que evidentes de que é para ser e será.


 A lua, iluminando o seu rosto, intercessora da concretização de nós, é testemunha ocular de que somos e estamos e sempre deveríamos ter sido. O mar, de amar, azulou-se. Beijar-lhe é tripudiar tudo que um dia nos negou acontecer. Para ser feliz, é necessário uma coisa só: deitar-me ao seu lado. Aqui. 

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Ela



  
  Escrevo atrasado demais, porque nem sequer sabia que podia escrever, mas você sempre faz com que as pessoas descubram suas capacidades ocultas. Escrevo, pois na aurora dominical lembrei de você. Sei que te deixei vazar pelas minhas mãos e nada há que possa ser feito para revertê-lo, mas queria te dizer que no meu silêncio couberam tantas coisas quanto no seu. Estava tão despreparado para te encontrar quanto você e a diferença está exatamente no seu dom mais que teatral de improvisação, que faz com que sempre se saia bem e tenha tato para lidar com o mundo. E por falar em tato, sinto falta das suas mãos quase infantis de tão pequenas, que cabiam nas minhas, dobradas, e eu até me sentia protetor por alguns segundos.

 Você é um caos ambulante; um caos bonito de se ver. Um caos que fazia eu me debruçar na mesa de restaurantes aleatórios para admirá-la (o que obviamente não justifica minha apatia). Você é essa coisa toda. Ora me deixava apavorado por ser tão mulher e perspicaz, ora me deixava desnorteado por ser tão menina e precisar de tanto cuidado, que não me julgava capaz de dar. Você é uma garota cheia de alma e cheia de vida. De vez em quando me assustava com tanta naturalidade ao parafrasear Maquiavel, pragmática como ninguém, enquanto eu tomava minha cerveja no bar de esquina, em frente à praia. E me fazia parar para ver o mar antes de te levar para casa e falava da vida como quem fala de preparar arroz: as coisas soam tão naturais e simples quando saem da sua boca, e isso realmente me amedronta. Você é simples. Elogiava as meninas, as roupas, a maquiagem, a elegância, se isentando de ser uma e não as diminuindo de forma alguma, porque para você, as coisas têm de ser como são, inclusive a beleza alheia. Essa é umas coisas que te fazem ainda mais bonita: você não precisa se sentir melhor que ninguém, mesmo quando realmente é.

  Você faz as pessoas se sentirem exatamente o que são e quando elas não sabem quem são, você abre o caminho, pega na mão, anda lado a lado e as conduz escuridão adentro sem medo de se perder também. É por isso que hoje sei que não preciso envenenar tudo o que sinto, porque não há mal nos sentimentos a não ser que deixemos. Você dia ou outro reclamava de não saber fazer nada, de não conseguir concluir nada que inicia e nisso concordamos: você é desorganizada e inconstante, mas onde já se viu, você escreve e faz todas as palavras fluírem linda e harmoniosamente, numa sinfonia perfeita, de sentimentalismo e realidade. Você canta afinado, tímida e distraída e sempre para quando percebe que estou ouvindo. Você faz as crianças te quererem como tia e os idosos, como neta. Você sabe quase toda a linha do tempo da Guerra Fria, mas quando o assunto se tornava História, você preferia ouvir, porque sua personalidade não te permite parecer arrogante.


Talvez eu pareça um poeta trovador, um daqueles que colocavam a mulher amada como deusa máxima. Sei que você tem defeitos, mas há bastante tempo venho procurando-os para justificar minha distância, e é difícil enumerar muitos, a parte boa se sobressai. Sinto falta de acordar acariciando o travesseiro e procurando os fios ruivos que você sempre deixava nele antes de ir. Juntava-os e colocava na lixeira do banheiro. Se pudesse voltar no tempo, guardaria num vasilhame de vidro, para de alguma maneira acreditar que algo de você ficou. Levaria você ao aniversário da minha avó e tenho certeza que suas bochechas corariam quando, gritando (ela está ensurdecendo), diria que você é uma graça e eu assentiria com a cabeça. Se pudesse voltar no tempo, compraria algumas revistas teen e com recortes de textos de auto-ajuda montaria o meu próprio para dizer que gosto de muitas coisas em você e até de você. Jogaria sinuca e não te deixaria acreditar que “não é bonita ou inteligente, porque ninguém é e ninguém nunca vai ser” (como naquele filme com o cara de High School Musical), porque você é. E muito. Seu batom vermelho fazia todos os olhares e expectativas concentrarem-se em você, e esse era um passo para as pessoas repararem nas suas curvas. Mas logo depois, tudo isso tornava-se pequeno. Porque quando você abre a boca, de forma mística e ao mesmo tempo real e simples, prende as pessoas. Voltaria no tempo e caçaria as palavras, circulando-as com caneta esferográfica, nos seus cabelos, no seu corpo, nas pintas quase invisíveis do rosto para saber qual devo usar para dizer que eu realmente te amei de um jeito que não era para ter sido, mas foi. E não me arrependo. 

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Algum lugar que apenas nós conhecemos



Leia ao som de Somewhere only we know.


 Gosto de escrever quando sai e me deixa aqui, sozinha, com um monte de você pela casa. Aliás, no início, achava bem estranho você sair para a faculdade ou trabalhar e querer que eu ficasse. Até me dizer que a graça está em voltar e me encontrar. E como temos nos encontrado... Como naquele dia. Eu nunca acreditei em como as pessoas se conhecem nos filmes. Aí você derrubou vinho (quem bebe vinho em boates?)  no meu vestido vermelho, no fundo da balada. Eu gritei. Você me achou louca. Só queria ir embora, mas eu tinha uma amiga dançando e um cara desastrado que esperava o primo beijar alguém. Descobri que você odeia Exatas tanto quanto eu.

 E depois, eu estava sendo sequestrada por madrugadas aleatórias para andar de carro pela cidade e saber como ela é quando não tem ninguém olhando. Por sinal, ela é muito mais bonita e atraente, assim como nossa história, porque não há olhos curiosos sobre nós. Veio o vestibular e todo o meu desespero. Foi aí que conheci sua casa e descobri que Camboja fica do lado do Vietnã. Aprendi mais de Geografia nessa tarde que nos 14 anos de escola. Discutimos política; se deve ou não haver redução da maioridade penal; se doce de leite é melhor que chocolate. E, de repente, eu estava lá de novo. Estudando enquanto você tocava piano. Não existe nada mais elegante que tocar piano. Principalmente quando se trata de você e do jeito que prende o lábio com o dente quando está concentrado. Você queria algo que rimasse com “hipotético” e eu sugeri “poético” e agora fazemos músicas nas tardes de folga.

  Às vezes, te acho homem demais para mim, uma garotinha que não sabe nada da vida. Você foi a coisa mais-não-planejada que já me aconteceu. E toda a insegurança vai embora quando me pede para ser sempre tão menina. Para continuar sendo eu. Você sempre diz que sou uma menina cheia de alma, vida e história. Mal sabe que, na verdade, nunca pude colocar para fora tanta alma quanto agora. Não tenho mais medo de fazer isso.

 Um dia desses, saímos para pedir pizza e umas garotas da faculdade foram te cumprimentar. Observava, de longe, sorrateira. Assim que virou de costas, elas comentaram sobre sua roupa e como você é bonito. Bobinhas... É raro uma garota não te olhar, mas é maravilhoso saber que é a minha foto que está na sua carteira (e vergonhoso lembrar da minha careta nela). É maravilhoso ser quem sabe que a pizza é de frango com catupiry sem orégano e, melhor ainda, ser quem a divide com você.

Gosto de como falamos, do quanto falamos e de falarmos tanto da vida. De tudo. Desde as guerras mais importantes na América do Sul, até tentar adivinhar que bebida está na caneca do Jô Soares.  Você foi tomar banho e pediu que eu ficasse te esperando do lado de fora, no quarto, só para não deixarmos o assunto pela metade. Acordei, no dia seguinte, na sua cama. Com uma camisa preta gigante do lado e um bilhete de “é o melhor que tenho”. Desci, envergonhada, e encontrei travesseiros no sofá e uma mesa de café da manhã. Você me olhou, olhou de novo e soltou um “uau! Como você fica sexy com a minha roupa”, ironizando o fato de eu odiar ser chamada de sexy. Eu dormi na sua cama sem nunca termos nos beijado. E você não quis tirar a minha roupa para isso.

 Algumas semanas depois, era o meu domingo na escolha do filme. Errei de novo. Uma comédia péssima e ríamos só para não prolongar o silêncio. E você me beijou. E, novamente, mais algumas vezes. Mas, depois disso, você continua me deixando falar, e falar, e falar, até não querer mais. Porque te importa mais que eu esteja aliviada e em paz, do que me calar. Você é vinho depois de vodka. Tira o amargo. Quase ninguém sabe sobre nós e é isso que me faz, pela primeira vez, não precisar de garantia alguma: temos um lugar só nosso no mundo. Um lugar secreto em nós. 



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Tortura





























Leia ao som de Por que você faz assim comigo?, da Mallu Magalhães.

  Passo boa parte da semana aqui, do lado dessa estante velha, vendo as pessoas passarem pela janela. E a vida. Passando, normalmente, porque não pode alterar seu curso normal por minha causa. Fico aqui, quietinha, descansando. Porque estou sempre exausta, sempre querendo um canto para me jogar, sempre olhando para o celular, esperando a bendita hora que sua mensagem vai chegar e, eu com certeza não vou saber onde você está, mas estarei um pouco mais aliviada. Na complexidade do nosso não-relacionamento, da angústia onipresente, você me acalma. Sabe, é como morfina: alivia a dor. Ou mata.

 Quando você chega, calado e misterioso, falando estritamente o básico, e entra no quarto, já sem camisa e tirando os sapatos, te observo da cabeça aos pés (e te desejo) e fico vidrada, te encarando, esperando ser cuidada. Não, não é submissão. É esperança. Porque não era para ser diferente disso, entende? Não era para ser diferente de entrega mútua. Pessoas se envolvem porque querem, porque se apaixonam, pelo destino, sei lá. O fato é que, depois de se envolverem, elas criam laços. Mas você não. Você criou nós. Um no meu peito, que todo dia lembro da existência, porque aperta um pouco mais. E outro no meu pescoço, prestes a me matar enforcada.

 Eu te olho. Olho e espero. Espero mais. Quando nos beijamos, sinto até meu dedo mindinho do pé mexer, o estômago revirar, e eu até fico com medo de você achar que estou com fome, mas não: é aquela reação, ainda sem nome, causada pela felicidade (e agonia) de estar com quem se gosta. Mas me sinto masoquista, me sinto como alguém que de uma parede corre até a outra. E se joga. É que, na realidade, queria que me salvasse da outra parede. Que correspondesse à minha corrida e estivesse lá, do outro lado, esperando para me pegar. Mas não. E eu vou me atirando.

 Eu te olho e olho todinho. O traço dos olhos, meio puxados; a linha da sobrancelha; as mãos grandes e firmes; o sorriso que não deixa os dentes de baixo aparecerem. Eu sinto tanta vontade de te abraçar... Sempre. Às vezes, no meio da noite. Às vezes, durante a aula. Eu lembro de você e penso no quanto gostaria de te poupar do mal. Mas e eu? Por que você faz isso comigo? Por que me deixa assim, à mercê?

 Quando olho esses porta-retratos vazios, na sala dos meus pais, penso em quantas vezes acreditei que dali a pouco eles estariam preenchidos por nossas fotos. E lembro que não faço a menor ideia de onde você está. Nem do seu prato predileto. E sequer imagino quem manda as mensagens que fazem seu celular apitar milhões de vezes, irritante e incessantemente, enquanto estamos juntos.

 Estou aqui. Cheia de roxos. Cheia de medo. E cansada, muito cansada. Queria fechar os olhos e dormir. Mas não houve um dia, depois de você, que tenha conseguido. E penso, e penso e penso mais. Não tenho malas a fazer, nem um anel para tirar do dedo. Nenhum toque de drama para, sei lá, fazer parecer bonito. É doído. Doloroso. Um tchau seco e interior, porque nem para me ouvir dizer adeus você está aqui. É solitário. Te amar é solitário. Parece aterrorizante denominar essa coisa, não é? Soa pesado. Amar. Solitário. Eu ainda não entendo e não é uma tarefa fácil, mas até para ir, penso em você. Na sua solidão após mim. Porque eu te ouvia. Talvez você que não quisesse falar, mas eu te ouvia.

 Eu não sei quantas delas há. Mas sei que olha para elas e as compara a mim. Que me coloca num degrau acima, como alguém que não deveria estar incluída quando você fala das garotas com quem se envolve. Mas sou uma garota normal. Tocável. E estar num degrau além, é o que também nos distancia. Não sei se há prazer em me maltratar. Não sei se você lembra e ri. Não sei se você percebe, mas, se sim, por que você faz assim comigo? 

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O que vem depois do depois?


















Leia ao som de Read All About It, de Emili Sandé (novamente!).


Eu planejei coisas paras as férias e fiz quase todas. Fiquei ansiosa para começar no emprego novo e, nossa, quanta coincidência receber essa proposta. Eu penso nisso desde criança. Pensei no curso; em como comemoraria essa oportunidade. Não estava satisfeita com o lugar onde estudava. Mudei. Deixei tanta gente que amo para trás. E fracassei num relacionamento fracassado. O que acontece agora? O que acontece depois de tudo o que um dia a gente chamou de depois? É só viver normalmente e ficar esperando? Eu não sei fazer isso. Costumo fazer o plano A, e o plano B; e o C, só por precaução. Quando todos os planos acabam, o que as pessoas fazem? Por favor, me conte. Porque eu já liguei a televisão. E já li todo o livro de História. Eu já visitei meus avós e também fui a um barzinho. Eu acordo todos os dias esperando que hoje (meu Deus, tem que ser hoje!), eu encontre alguma resposta. Sei lá, a minha casa tem estado desconfortável e, os assuntos com meus amigos, sem graça.

Já se afogou? Pois bem. Eu tenho muito medo de mar. Acho que ninguém sabe, mas toda vez que vou à praia, fico observando o mar. As pessoas acham isso poético ou que é apenas admiração. Mas, na verdade, fico imaginando como deve ser a sensação de estar se afogando. Fico imaginando como é perder o ar e não ter lugar algum para segurar e poder respirar novamente. Imagino o desespero de engolir água e de tentar bater os pés, e ainda gritar ao mesmo tempo. Tenho me sentido assim. Aliás, esse é o conceito que criei para a sensação mais abstrata que ando carregando: a de estar sufocada e não ter onde segurar. Quando eu fecho os olhos, sinto a falta de ar. Sinto as bolhas saindo pelo meu nariz. Sinto a força da água.

 Já pensei que talvez eu só seja alguém que nunca está satisfeito com o que tem, mas é que, como é difícil... Estou em um lugar que não quero mais estar. Gosto da minha casa e do cheiro do meu quarto, mas as ruas me olham com rispidez. É utopia acreditar que posso me satisfazer só com o que está da porta para dentro. E todo o resto da cidade? Eu quero isso: a cidade.

 Eu quero poder querer o que quero. Sem as palavras empurradas para minha boca, sabe? Sem essa necessidade de dizer o que diriam, porque eu não diria. Eu não. Eu.


  E agora? Agora é o que chamei de “depois” há uns meses. E eu não conseguia enxergar que o depois tinha um depois. As pessoas me cumprimentam no ônibus e minhas amigas falam sobre o cinema de ontem, mas ninguém sabe responder a todas essas perguntas que carrego, dia após dia, para o meu travesseiro. Ninguém sequer  vê que ando por aí com uma interrogação na testa. O que vem depois de você ter feito todas as coisas que sabia que poderiam ser feitas?

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Casa


 Quando eu tinha uns quatro anos, no meu primeiro ano na escola, lembro de ouvir pela primeira vez, da minha avó, a pergunta que me faço quase todos os dias agora: "o que você quer ser quando crescer?" e, sem titubear, respondi: "juíza". Nenhuma menininha nessa idade sabe a complexidade dessa profissão nem o que ela é exatamente, mas eu sabia que um juiz poderia fazer com que um bandido ficasse na cadeia e eu achava isso fantástico. Sabe, no fundo eu vejo lógica. Eu não posso impedir que alguém faça o mal, mas posso puni-lo por isso.

 Eu fui uma criança muito sonhadora e também muito madura. Eu tinha que fechar os olhos para as cenas de sexo das novelas, mas lidei com uma depressão aos três anos. Não me considero vítima de nada. Fui muito feliz. Brinquei de Barbie e, nessas brincadeiras, eu era quem eu queria ser quando crescesse: tinha roupas legais, morava sozinha, fazia tatuagem, casava com o Ken e era vizinha da minha melhor amiga. Fui crescendo e criando mais sonhos. Mais difíceis, é claro. Passei tardes e mais tardes sonhando em viajar para a Disney. Lembro de uma garota da minha escola ter sido alvo da minha total admiração, porque ela foi a primeira pessoa que eu conhecia que foi para lá. Criei dois álbuns no Orkut: Dream 1 e Dream 2. Disney e festa de 15 anos. Dois anos depois, eu estava em absoluto silêncio ao lado dos meus tios e da minha prima (que falavam atônitos e eufóricos), com as lágrimas pingando e arrepiada em frente ao castelo da Cinderella. Minha mãe, na época, não poderia pagar a viagem de forma alguma e eu ganhei dos meus tios. Ela sempre dizia: "Beatriz, não crie tanta expectativa. Não que eu não torça por você, mas é mais provável que não aconteça". Meses depois dessa noite, eu estava dançando valsa com o meu pai sob os olhos de todas as pessoas especiais para mim.

 Tem segredo? Tem sim. Pedir a Deus todas as noites para que aconteça e ficar feliz pelas realizações das outras pessoas.

 Eu acho que eu nunca falei isso pra ninguém, mas todos os dias eu penso em quem eu quero ser quando crescer. Faço mil perguntas a mim mesma antes de dormir. Se eu vou realmente ser feliz arriscando minha vida na profissão que tanto quero ou mais: se vou escolher a coisa que mais amo em vez de a que sustentaria minhas metas; se vou encontrar alguém que me ame a ponto de ser completamente verdadeiro comigo e se essa pessoa vai querer ficar; se vou ser uma pessoa melhor e a filha que minha mãe tanto deseja; se as pessoas vão entender que eu realmente tento ser amorosa e acabo me atrapalhando; se um dia vou colocar a cabeça no travesseiro sem nem uma dessas perguntas.

 Não sei nenhuma das respostas que procuro e de vez em quando fico muito angustiada por me sentir tão impotente em relação à vida. Mas sei que todas as pessoas têm um lugar onde se sentem em casa. Um lugar onde se pode estar à vontade, falar o que se sente cem por cento; onde pode estar com qualquer roupa, sentindo qualquer coisa, seja ela boa ou ruim. Onde também estão as pessoas que ama. Um lugar para o qual se quer voltar quando bate o medo. Um lugar para o coração se sentir confortável e confortado. Para mim, esse lugar é a realização dos meus sonhos. Cada vez que realizo um deles, eu me sinto um pouco mais eu. Como se contasse ao mundo o quanto eu queria aquilo. Como se contasse ao mundo que sou um pouco daquilo também. Que fui à Disney, porque tudo que pensei na infância, pode sim, se materializar. Que tive uma festa de 15 anos, porque queria dizer a todas aquelas pessoas que foram, que são muito especiais. Que tatuei uma coroa, porque assim como a Rainha Elizabeth para a Inglaterra, minha mãe ocupa o papel central na minha vida. E os três pássaros no pulso, porque quero ser independente, viajar para muitos lugares, me sentir livre e ir para onde sou feliz. Que voei de asa-delta, porque queria ver a cidade que mais amo do alto e me sentir livre, como minhas três andorinhas. Todo sonho carrega partículas de quem somos. Toda realização de um sonho conta um pouco do que pensamos no escuro do quarto, com a cabeça no travesseiro. Conta aquilo que ninguém vê, mas que tem uma bagagem enorme de sentimentos que investimos.

 Casa é onde meu coração está. E, se o coração é meu, coloco onde quiser. Jamais duvide daquilo você quer ou ama. Nunca torça para que o outro quer, não aconteça. Casa é quem queremos ser para o mundo: a alma, o que ela deseja para si. Minha casa é tudo que desperta amor em mim.




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Eu odeio



  Eu prometi te deixar há alguns meses, mas eu mais uma vez optei pelo seu sorriso e pelo quentinho do seu edredom azul. Continuo com o olhar de quem nada sabe e com a risada presa pela fadiga. E eu queria saber. Queria muito saber o que nós somos, mas tenho medo da resposta. Medo daquela palavra de 4 letras que é o antônimo de tudo. Continuo te arrastando por aí como se fosse algo leve para mim, que sou tão fraquinha e que estou me matando aos poucos. Continuo colocando aquela venda preta sobre meus olhos, que já pedem voz à boca só para gritar “socorro!!!”,  com todas essas exclamações no final. Porque, coitados. Tão cegos. Tão inertes. Finjo não ver todas essas mensagens que chegam no seu celular enquanto conto do meu dia e do trabalho. Os seus olhos nos shorts de outra mulher. E até a sua boca em uma que não é a minha.

 Lembra de quando disse que você era meu fantasma? Descobri que, na verdade, sou eu que tenho poderes sobrenaturais. Sou invisível. Tenho sido. Como quando tentei te contar do problema no trabalho. Quando perguntei quando nos encontraríamos de novo. Como no dia que segurei o choro ao contar do sonho em que perdia um bebê que, na realidade, nem estou esperando. Mas, você sabe, eu sempre quis ser mãe. E você falou “isso é assim mesmo. Quando você acorda, acaba”.  Então sabe o que eu realmente queria? Acordar de você. Despertar desse pesadelo que é te esperar no portão com uma caixa de pizza e uma garrafa de Coca-cola para ter que passar o resto da noite em silêncio, porque é dia de jogo e, você sabe, cara, jogo é jogo. Estou guardando todos os meus silêncios para o dia em que, enfim, gritarei independência.

 Você me tortura sem precisar dizer ou fazer nada. Porque, meu bem, o nada é que dói. Acordar e nada. Nem um bilhetinho para dizer que sim, foi bom estar com você e seu chefe vai aprovar seu projeto. Dormir e nada. Aliás, eu prefiro dormir na minha casa, sozinha na minha cama, a dormir na sua, olhando para as suas costas que são tão acolhedoras quanto a expressão que você faz para mim. Mas às vezes, no meio da madrugada, você me acordava só para confessar algo que mais ninguém sabia. E foi a essas partes de nós que me apeguei para chegar até aqui menos calejada. Como na noite que me contou sobre o seu medo de barulho no telhado. Eu tenho esse mesmo pânico. Mas é do silêncio. Que. Você. Faz. Porque eu tenho mais medo é de falar de você e do que me causa. De todo esse movimento que acontece aqui dentro quando você me olha nos olhos.


 Eu odeio. Você e tudo isso que trouxe para minha vida. E todo aquele carinho que me dispõe quando há alguns copos de vodca dentro de você, onde deveria haver alguma consideração. Odeio o fato de você ter me levado para jantar. E ter feito todas aquelas pessoas olharem para nós com admiração. Como se fôssemos algo mais que duas pessoas que fogem de si e do amor. Como se fôssemos o que o outro realmente quer. Odeio que não tenha o mesmo cuidado com o que sinto, como o que teve nas poucas vezes que te deixei tirar meu sutiã, tão leve e delicadamente, que nem percebi, só senti o arrepio de saber que seus dedos deslizavam pela minha pele. Odeio esse cheiro de cigarro. E não odeio só o cheiro. Odeio esse cigarro no canto da carteira que, eu sei, você vai acender assim que perceber que eu não estou mais nessa, que não tem mais livros espalhados no seu criado mudo. Sentado no meio fio. Vai fumar o cigarro inteiro, entrar em casa e deitar. E amanhã vai trabalhar, ver o jogo, deitar para dormir e virar para a parede. Assim como quando eu estava aí. Porque eu era um mero detalhe. 

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Como gavetas



 Toda vez que passo um tempo sumida do blog, dou desculpas esfarrapadas em relação à falta de tempo e ao excesso de compromissos. Não que não seja verdade, mas não a principal causa. Esse ano passei a ver esse espaço como uma caixa de lembranças. Durante o tempo ausente, gravei alguns vídeos e tive ideias para novas pautas. Aí fiquei sem internet no período de um mês. Vocês sabem como é, às vezes só precisamos de um tempo. E de ficar sozinhos. Tanta coisa inesperada e positivamente surpreendente aconteceu, que deixei algumas coisas de lado para abraçar as novas oportunidades. Ou deixar algumas outras. Só posso dizer que deu certo.

 Percebi que andava dando sinais de que estava caminhando na direção oposta à que almejo. Há uns meses, li no Facebook uma teoria de que nossa vida refletia o estado das nossas gavetas. Abri meu closet e vi que as minhas estavam aparentemente bonitas, desde que estivessem fechadas (na verdade as roupas estavam emboladas e amontoadas). Arrumei tudinho e doei algumas roupas. Seria muita superstição dizer que a partir desse dia as coisas que pareciam confusas começaram a se ajustar?

 O importante é que, mais uma vez, aprendi bastante. E quem lê o DDD com frequência sabe: não sem ouvir algumas músicas tristes e me entupir de Kit Kat. I'm back, bitches! (desculpem-me pelo palavrão, o vício em PLL me obriga a usar essa frase).

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Ouça bem, menina


Leia ao som de Just a Little Bit of Your Heart, da Ariana Grande.


Eu tenho te observado quieta pelos cantos. Vi que, ainda esses dias, você chorou quando comentaram sobre o filme que estreou mês passado. Na verdade, tenho te observado, sabe? Não é de hoje. E, menina, chega disso. Nem calculo quantas pessoas já devem ter lhe dito essa frase e sei também que não esperava que fosse mais uma delas, mas já pensou que todos podem estar certos? E estão.

 Tenho te olhado desde dezembro, desde o banco da praça e do beijo que você deu nele. Eu te vi no ano novo, pedindo às estrelas, que esse ano fosse o de vocês. Eu sinto muito, mas é impossível passar 365 dias ao lado de quem só lhe quis por uma semana. Sabe, menina, eu o vi no carnaval. Vi que ele bebeu e que lhe trocou por várias que, juntas, não davam nem metade do que você é. E, em silêncio, te observei chorar no travesseiro, longe de tudo, imaginando o que ele faria naquele momento. Ainda bem que você não pensou nessa possibilidade, porque doeria um pouco mais. Lembra daquele dia que chegou em casa ainda com o frio na barriga e pôde jurar por tudo e todos que sim: dessa vez sim? Mas não. Não era nada disso e até eu, mero narrador, achei que fosse. Dizem que é errado me envolver na história, mas por uns momentos torci por você e, confesso, também pedi às estrelas. Porque, quando você sorri, o mundo para, menina. Para e te olha, concordando em uníssono: há amor em algum lugar. E você merece vivê-lo.

 Você é doce, no falar e no cheiro. Nesse vai-e-vem-tic-tac, perdida, você ainda ouve aquela música sem perceber que, no fundo, é você que não sabe por onde anda enquanto tanta gente te procura. Junta todos esses pedacinhos e relembra quem você era em setembro do último ano. Você era completa. Era feliz. Não procurava em todos os rostos, em todas as esquinas quem te flechou. E, sem romantizar: não se trata de cupido. Ele te enfiou uma flecha no peito e vem te matando dia após dia. Quantas vezes o sol vai precisar nascer e se pôr para você perceber que já não existe nem resquício de vocês? Evaporou. Lembra da equação dos gases perfeitos, em Química? Pois bem. Use-a para esse amor solitário, que mais me parece uma cruz.

Ouça bem, menina: você é uma raridade. E, era segredo, mas existe um mundo inteiro esperando o seu primeiro passo para girar mais rápido e te fazer dançar. Ligue para o salão, marque a tão adiada mudança e, junto com o excesso de pontas, deixe toda essa tristeza no chão. Colora o cabelo e a vida. E me esqueça, você não precisa mais de um narrador. Pegue a caneta e escreva sua própria história. É com você, menina.

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